terça-feira, 10 de março de 2009


Um país inacreditável


Huberto Werneck

Nada como uma bela inteligência, sobre tudo quando acoplada ao bom humor e uma sensibilidade de artista. Essa preciosa mescla era um dos encantos mais deleitáveis da escritora americana Elizabeth Bishop, que um grande amor prendeu ao Brasil por longos anos, de 1951 a 1974. Em cartas a amigos nos EUA, ela destilouimpressões sopre o país e o povo:
“É gostoso e relaxante estar num país onde ninguém sabe direito em que estação do ano estamos, em que dia estamos, que horas são.”
“Tem homens de calção chutando bolas de fultebol por toda parte.”
“Como país, acho que o Brasil não tem saída – não é trágico como o México, não, mas apenas letárgico, egoísta, meio autocomplacente, meio maluco.”
“É um país onde a gente se sente de algum modo mais perto da verdadeira vida, a de antigamente.”
“Aqui as pessoas amam as crianças mas do que em qualquer outro lugar – com a possível exceção da Índia. Nenhum sacrifício é grande demais quando é feito em nomes dos filhos.”
“O carnaval é uma grande confusão, porém organizada e artística.(...) Acho que o samba é a última poesia popular que ainda se faz no mundo.”
“Gosto muito do idioma – cheio de diminutivos, aumentativos, formas carinhosas etc.”
“Outro verbo muito bom e humano que faz falta no inglês – quando você quer pular for a de compromisso ou desconvidar-se:‘desmarcar’.”
“Já observei que us escritores daqui costumam aparecer em fotos deitados em redes, e talves seja este o problema da leitura brasilheira.”
“Aqui há uma espécie de obsessão com beleza – todo mundo vive descrevendo os olhinhos e narizinhos e queixinhos das crianças – e quando os vejo, muitas vezes me decepciono. Mas o nível geral de beleza é um tanto baixo.”
“O caju é uma combinação indecente de fruta com castanha.”
“Os brasilheiros parecem adorar doenças.(...) É muito interessante adoecer e tomar remédio em português e os brasilheiros ficam na maior animação quando tem alguém doente.”
“O único órgão que a maioria dos brasilheiros reconhece é o fígado; a gente chega a ficar enjoada de ouvir conversas infindáveis sobre o estado do ‘fígado’ de cada um.”
“Essa mistura de bom gosto com gosto atroz é bem brasileira...”
“Ah, que país inacreditável!”